PDR 2020 só prevê 27 milhões para instrumentos financeiros na agricultura

Afinal, a possibilidade, confirmada pela ministra Assunção Cristas, de aplicação dos instrumentos financeiros (IF) do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR) em Portugal poder mobilizar até 400 milhões de euros para investimento na agricultura através da cooperação com o Banco Europeu de Investimento (BEI) - de que falou Phil Hogan, comissário europeu da Agricultura, na sua primeira visita oficial ao país - não chega a esse montante.
Em entrevista à “Vida Económica”, o secretário de Estado da Agricultura, José Diogo Albuquerque, revela que o PDR 2020  apenas prevê para Portugal “cerca de 27 milhões para IF como valor indicativo” para este fim, ou seja, “uma parcela de quase 7% do montante UE destinados aos IF”. E a sua operacionalização ainda aguarda a “validação final por uma comissão de acompanhamento criada para o efeito”.

Vida Económica - Phil Hogan, comissário europeu da agricultura, esteve há dias em Portugal, pela primeira vez nessa qualidade. Que balanço faz dessa visita?
José Diogo Albuquerque -
A visita do comissário Phil Hogan correu muito bem. Procurámos mostrar-lhe que “Portugal tem a casa arrumada”. É muito importante para Portugal mostrar que está empenhado em fazer um bom trabalho e que são muitos os exemplos de sucesso no nosso setor agrícola. Foi muito positivo ouvir o comissário dizer que “Eu acho que Portugal está a fazer um excelente trabalho”.

VE – E que pontos foram analisados?
JDA -
Alguns dos temas abordados nestes dois dias de visita foram as opções nacionais para aplicação da PAC para os diferentes setores, a manutenção da atividade agrícola no meio rural em benefício dos jovens agricultores, o aumento da concentração da oferta e a manutenção da atividade agrícola em todo o território, entre outros, como a simplificação dos regulamentos e as correções financeiras. O encontro com as organizações do setor também foi um momento marcante, pois houve um espaço para debate onde as várias organizações tiveram a oportunidade de colocar questões diretamente ao comissário.

VE – Phil Hogan anunciou que Portugal pode operacionalizar, através do PDR 2020, uma linha de crédito até 400 milhões para a agricultura em parceria com o BEI. Que diligências o MAM está a fazer para concretizar a medida?
JDA -
Em primeiro lugar convém referir que a linha de 400 milhões é para a totalidade dos Estados-membros da UE. O comissário Europeu para a Agricultura e Desenvolvimento Rural apresentou a sua “desilusão e alerta” pelo facto do valor previsto para instrumentos financeiros (IF) no âmbito da totalidade dos  Programas de Desenvolvimento Rural (PDR) aprovados até à data relativos a todos os Estados-membros ser apenas de 400 milhões, contra cerca de 50 mil milhões de subvenções. No entanto, o PDR2020  prevê cerca de 27 milhões para IF como valor indicativo. Ou seja, Portugal detém uma parcela de quase 7% do montante UE destinados aos IF, o que corresponde a uma aposta em linha com a ambição desta iniciativa do comissário da Agricultura.

VE – Quais são as regras europeias nesta matéria?
JDA -
Existe um entendimento entre a Comissão Europeia (CE) e o Banco Europeu de Investimento (BEI) sobre a cooperação em agricultura e desenvolvimento rural no âmbito da UE, assinado em julho de 2014 e cujo programa de trabalho tem, entre outros objetivos, o desenvolvimento de modelos de IF para a agricultura, tendo sido apresentado em março um primeiro modelo que corresponde a um IF destinado à garantia de empréstimos. Na sua deslocação a Portugal o comissário europeu para a Agricultura considerou que os IF podem ajudar a uma maior criação de valor através da política de desenvolvimento rural. E deu o exemplo do instrumento de garantia desenvolvido, onde um euro aplicado pode permitir um investimento de cerca de cinco euros a taxas de juro de empréstimo reduzidas (alavancagem do investimento) por parte, por exemplo, dos jovens agricultores e outros empresários rurais. Isto, no sentido do objetivo do crescimento e emprego, representando, assim, o trabalho conjunto da CE e do BEI na definição dos pormenores dos IF um enorme passo no sentido de se conseguir realizar o descrito através de uma cada vez maior utilização dos IF.

VE – E quanto a Portugal, concretamente?
JDA -
No caso de Portugal foi desenvolvida uma avaliação ‘ex-ante’, envolvendo todos os Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (FEEI) e programas que previam a possibilidade de utilização de IF, englobando no caso do FEADER, o PDR 2020 e os PDR dos Açores e da Madeira. O relatório final foi recebido recentemente e encontra-se em validação final por uma comissão de acompanhamento criada para o efeito.

“Casa do Douro deve 16 euros a cada português”

Está em processo de seleção a nova associação de direito privado que vai gerir a Casa do Douro (CD), depois de um processo turbulento que deixou um passivo de mais de 167 milhões de euros e cerca de nove milhões de litros de vinho do Porto.
O secretário de Estado da Agricultura, que assumiu a tutela do dossier, quer “uma organização limpa de dívidas e mais focada no apoio técnico aos viticultores e não no problema das dívidas e das ações judiciais”. Só isso, diz, contribuirá para a afirmação da futura CD junto dos produtores, já que a turbulência existente “é o espelho de um problema que se vem avolumando há mais de 20 anos, com uma dívida crescente ao Estado, aos trabalhadores e fornecedores”. Hoje, frisa, José Diogo Albuquerque, “a CD deve 16 euros a cada português”.
A Portaria 268/2014, de 19 de dezembro, definiu as regras para a seleção de uma nova entidade, de direito privado, para suceder à CD. E apresentaram-se duas entidades – a Federação Renovação do Douro (FRD), liderada por António Lencastre, das Caves Vale do Rolo do Peso da Régua, e a ALD – Associação da Lavoura Duriense, a que preside Alexandre Ferreira, há cerca de 16 anos ligado à CD.
O relatório preliminar do Instituto da Vinha e do Vinho (IVV), datado de 19 de fevereiro, a que a “Vida Económica” teve acesso, revela que a FRD ganha vantagem, pelo total de viticultores associados (6678 contra 6172 da ALD) e pelo total de área de vinha que os mesmos produtores exploram (15.846,28 hectares contra apenas 7.682,96 hectares da ALD). Possuindo a Região Demarcada do Douro (RDD) 23.197 viticultores, segundo o IVV, e 43.817,07 hectares (dados da campanha 2014/2015), a representatividade é a seguinte, de acordo com o dito relatório preliminar – FRD “31% (29% do número de viticultores e 36% da área de vinha da RDD)” e ALD “24% (27% do número de viticultores e 18% da área de vinha da RDD)”.

“Estão reunidos os pressupostos legais para a insolvência”

Quanto à dívida da CD, que ronda os 167 milhões, “o Governo estava disponível para perdoar 30 milhões de juros”, o que “permitiria que a CD ficasse com 6,5 milhões em vinho e recuperasse todo o seu património que está hoje penhorado/hipotecado em 90%”. E “estava previsto um adiantamento de 1,8 milhões para pagar salários em atraso e dívidas aos fornecedores, que permitia à CD chegar a 2015 limpa de dívidas e com património suficiente para relançar a sua atividade”.
Porém, “e infelizmente para todos, a direção cessante da CD não aceitou a proposta” do Governo e, diz José Diogo Albuquerque, “fomos forçados a seguir o que a Lei previa, ou seja, que a regularização das dívidas fosse feita em sede de processo de insolvência judicial”.
O pedido de insolvência deu entrada no tribunal no final de 2014, mas este foi indeferido. Depois, o Ministério Público apresentou recurso da decisão preliminar do tribunal. Apesar disso, o governante está “convicto num desfecho favorável”, até porque “estão reunidos os pressupostos legais que podem sustentar um pedido de insolvência”.
A decisão final do IVV quanto à indicação da entidade vencedora é esperada a qualquer momento.